sábado, 23 de novembro de 2013

ESCOLHER A PAISAGEM: COM VISTA... OU SEM VISTA?...




Acordei e fui à janela da cozinha. Tenho este hábito desde sempre. A primeira coisa que sempre faço quando acordo é ir à janela. Gosto de ir à da cozinha, porque tem uma vista desafogada. 
Para quem conhece a margem sul, vai perceber o que é a "minha vista" de casa: estou na Cruz de Pau e vejo o horizonte até à primeira ponte do Feijó, na A2 e tudo à sua volta. Vejo as moradias dos Foros de Amora, vejo a área de serviço do Seixal, vejo a urbanização de Santa Marta do Pinhal, vejo Corroios, Laranjeiro e parte de Almada... vejo parte da Ponte 25 de Abril. Vejo muito céu e apercebo-me quando está a chover em Lisboa, enquanto aqui nem um pingo de água. 
É das coisas que mais gosto nesta casa, neste apartamento, que não é grande, mas é para mim e para os miúdos, acolhedor...


Durante muito tempo não gostei desta casa. Esta foi aquela que comprei, quando tudo corria bem... quando em Portugal vivíamos o sonho de ter casa própria. Foi há 15 anos. E na altura, não fiz nenhum disparate. A verdade é que ganhava o suficiente para pagar a casa, o carro, todas as despesas e ainda me sobrava dinheiro no fim do mês. 
Era bom. Ainda me dava ao luxo de comprar as roupas de que gostava e todos os acessórios a condizer, desde os cintos ao calçado, passando pelas malas, brincos, pulseiras, anéis e até relógios, tudo a fazer "pandã". 
Apanhei um vicio que é o único que mantenho até hoje: a roupa interior tem que condizer com a roupa "de fora". Se visto uma camisola cor-de-rosa, a lingerie é da mesma cor. No limite será branca, se na altura não tiver outra opção. Já os relógios, por exemplo, optei por não os ter. Agora vejo as horas no telemóvel. E já não me lembro da última vez que comprei brincos, pulseiras, cintos ou anéis...

Pelo meio... durante estes anos, vivi em Bruxelas. Se alguém viu o filme "Gaiola Dourada"... aquela era a vida que eu tinha... a da personagem interpretada pela Rita Blanco. Era bom... a casa onde morava não tinha "vista"... era num rés-do-chão, mas era muito em conta: eu não pagava renda, nem água, nem luz, nem aquecimento, nem telefone. E ainda tinha ordenado. Não fosse os abusos das pessoas, mas principalmente um problema de xenofobia da educadora do meu filho contra nós, talvez tivesse aguentado mais tempo... 
... embora me estivesse a sentir estúpida, porque sabia que tinha capacidades para mais. É algo de que também sofrem cá os imigrantes de leste... que no seu país têm estudos superiores e por aqui são tratados de forma diferente... e a maioria só "serve" para trabalhos de limpezas e obras (agora nem isso... porque até nessa área há muito menos trabalho). 

Depois, já em Portugal, caí noutro sonho: o de querer ter um negócio próprio. Inicialmente ia abrir algo com uma amiga, e o dinheiro a investir era relativamente pouco. Mas outro colega, que sonhava em grande, conseguiu convencer-me a entrar numa "coisa em grande": um franchising. Não precisávamos de investir o nosso dinheiro - dois bancos "emprestavam-nos" tudo. Rapidamente se tratou do assunto. E a certa altura acabei por ir viver para perto do "meu" negócio. Em Sesimbra vivi em dois apartamentos, ambos também com vistas desafogadas. O último era denominado pela "Casa do Mar"... nome dado pelo meu filho mais novo. Era um duplex excelente, com vista para o mar, claro...
Acordar, ir à janela e ver o mar, é das coisas mais maravilhosas para começar o dia. Ficou-me "no goto" esta casa... e no dos meus filhos também...
Mas tive que regressar "à base" há quatro anos. Tudo mudou e não foi para melhor desta vez.
No entanto, tenho tentado aguentar todas as dificuldades, toda esta nova vida, mas sempre a tentar levar "a minha avante"... no sentido de tudo ficar melhor, senão igual... pelo menos melhor.

Não está a ser fácil. Não meus senhores, não está. 
Ontem "passei-me"... 
... de tal maneira que fui desabafar ao Facebook, coisa que não fazia há que tempos... e coloquei esta frase: "Este ano, aqui em casa não há Natal. E tenho a impressão que vai ser o meu último neste país. Desisto."

Valeram-me os bons conselhos de amigos, que me transmitiram força e calma para continuar... deitei-me mais serena... 


A gota d'água surgiu quando os meus filhos andaram "à bulha", quase que se matavam... e os óculos do mais velho partiram-se ao meio. Fiquei de rastos. Se não consigo pagar o arranjo da minha máquina de lavar roupa, que está avariada, nem os arranjos de duas tv´s cá de casa... (vindas dos tempos áureos), agora onde vou eu conseguir pagar uns óculos novos ao miúdo? 
Estamos a um mês do Natal e este ano não há subsídios para ninguém. Entenda-se este "ninguém", pela minha mãe (na casa dela, mas a única pessoa de família com quem posso contar)... e eu. A minha mãe porque é reformada e eu, desempregada -para todos os efeitos- a fazer uns trabalhos de escrita por aqui e por ali, mas que não "trazem" qualquer tipo de subsídio... 
E sinceramente chateia-me mais isto no Natal do que nas "Férias de Verão", que não tenho, mas que ainda assim, há a possibilidade de ir à praia, a 10 minutos de casa...

No Natal o conceito é outro. Nem sequer tenho família grande para me juntar, ou eles juntarem-se a mim... está tudo longe e entretanto, por várias razões, tudo isso acabou... não há "ajuntamentos" no Natal. Valiam-me os meus filhos... e os meus vizinhos (onde fui criada). É essa a minha família. Juntamo-nos todos em casa dos pais (neste caso, das mães - ambas viúvas agora), porta com porta... e andamos a noite de Natal de casa em casa, a comer e a beber, aqui e ali e os miúdos a brincar, todos contentes. 

Mas este ano, tudo se complica. Já se sabe que o dinheiro não traz felicidade, mas facilita muita coisa... como diz Catarina Beato... uma jornalista com uma vida parecida com a minha, menos complicada... mas em quem eu tento inspirar-me de há uns tempos para cá... a ver se me foco no essencial... e tal como ela, tentar viver com o que tenho. Só que o que tenho não chega. E não falo em coisas supérfluas. Falo mesmo no essencial.
E se isto não muda brevemente... já coloco a hipótese de sair do país, como tantas outras pessoas que já o fizeram. 

Não quero, meus amigos. Não quero mesmo. Viver "lá fora" não é para todos... e acho que não é para mim. Não é uma vida maravilhosa, como muitos ainda apregoam. Vou tentar resistir até ao fim. Mas se nada muda... vou ter que deixar tudo para trás e ir fazer a minha vida para outro lado, mesmo que não tenha uma "vista" maravilhosa... e tenha que passar pela provação de não estar no meu país, que é afinal, a minha verdadeira casa. 



1 comentário:

  1. Ola Ana ...
    É maravilhoso viver numa casa que gostamos e ter uma boa vista sem duvida,já tive uma experiência não foi muito tempo mas um 13º andar com vista para o mar é magnifico ...
    Ana sem querer que te ofendas ou me leves a mal,eu gostava muito de poder-te ajudar de alguma forma em algo prático,dado a nossa proximidade geográfica adoraria poder-te valer seja no que for pensa com carinho nisso tá ...
    A vida não esta fácil para ninguém e embora não tenha o trabalho que sempre desejei nem o ordenado merecedor do mesmo uma coisa eu tenho ,que é um trabalho sendo solteiro e sem encargos já me movimento de outra forma ...Este mês gostava de dar um presente a mim mesmo e ajudar uma pessoa que admiro muito ... Não consigo imaginar o momento que estas a passar, nem tenho o poder de te resolver tudo "que faria sem sombra de duvida se tivesse"mas se poder contribuir, nem que seja para 1 milésimo dos teus problemas mais imediatos ia me sentir presenteado pelo Pai Natal ...
    Pensa com carinho estou ao teu dispor ...

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